sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

O que se leva da vida é a vida que a gente leva









O assunto apareceu do nada e foi desfazendo grupinhos e aglomerando todos num só em volta da telinha que mostrava um site sobre os 10 melhores empregos do mundo.A esta altura alguém soltou a graça conhecida: __ "Quando estiver com vontade de trabalhar, sente-se num canto e espere a vontade passar." Só que não é bem assim que a banda toca seus repiques, bem o sabemos e a escolha feliz dum trabalho que agregue função e gosto não é tão simples assim.O que não faltam são histórias tanto do exitoso(a) quanto do frustrado(a).

Por agora seguimos na brincadeira de eleger uma das opções que o tal site apresenta.O filho queria ser testador de camas, ao que ganhou uma sonora vaia da assistência.O outro, zelador da ilha deserta e recebeu logo ofertas de parcerias.A netinha mais velha não teve dúvidas, degustadora de chocolates e ganhou minha adesão.Entre risos e inovações todo mundo deu seu pitaco sobre qual seria o melhor trabalho do mundo.

Há mais opções do que eu supunha.Vocês ouviram falar em testadores de piscinas e tobogãs? Deve dar um interminável friozinho na barriga.E testadores de sorvetes/picolés,heim? Que tal? Nesta canícula abrasadora até que é apetecível um serviço assim, não? Ah, tem também o avaliador(a) de tours e viagens de luxo;uau! Este aí tem tudo a ver comigo(rs).Há ainda o brincador(a), é isso mesmo que vc leu, aquela pessoa encarregada de usar os brinquedos recém-criados e testá-los sob todos os aspectos, desde a segurança até o nível de divertimento proporcionado.Uma baita oportunidade de resgatar sua criança e ainda posar de autoridade no assunto. Legal, né?

Lendo mais além descobri nas letrinhas miúdas que o senhor A.E. especialista de qualidade dum famosa marca de chocolates engordou 6 quilos depois que começou a trabalhar nesta função.Pois é, tudo tem seu peso, cabe a cada um decidir ( se puder). E vc, qual destes ou outros tipos de empregos maneiros escolheria? Conta aí!!!

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Imagem: guiadasemana.com




domingo, 22 de fevereiro de 2015

Guardar a esperança d'outra noite igual









Em ato contínuo respirou fundo o frescor do ar noturno descendo suave sobre a casa,sobre o pátio, sobre ela; o manacá oferecia seu perfume nas asas da brisa soprada.Sentou-se no degrau de pedra a sentir cada instante que se seguia cadenciado pelo ritmo calmo que a tudo envolvia.

Ele dormia tranquilo e parecia entregue ao sono reparador, prometendo descanso e paz.Uma noite como outras antigas, saudosas, vindas nas lembranças de tempos mais tranquilos.Agora, as noites eram penduradas em interrogações ansiosas, avizinhando possíveis vigílias, prenunciando curtas aflições.

Mas, não essa. Essa não.Essa seria retorno ao tempo das calmarias, dos sonos profundos bem sonhados.Essa traria horas conhecidas, repouso seguro.Lembrou-se de quem, como ela, já tivera noites certas e que agora as tinha em desalinho, a velar as cabeceiras dos enfermos de todas as idades, a espreitar a segurança dos seus, a espantar os medos, a afastar preocupações, a atender desesperos, a tirar apuros, a ouvir, a prestar auxílio... porque a noite não detém os ponteiros da vida.

Só, que essa, especialmente essa, já diminuíra o ritmo do relógio e anunciava entre lufadas cheirosas que as horas seriam reparadoras de todas as dores.Que assim o fossem mesmo, para ela e para o mundo;  esperança guardada d'outra noite assim.



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Apontamento

Ó noite, ó noite, ó noite! 
Luar e primavera
e os telhados cobrindo
sonhos que a vida gera. 

Subo por essas horas
solitária e sincera,
e encontro, exausta e pura,
 minh'alma que me espera.


( Cecília Meireiles, in: Poesia Completa)





Imagem: infoescola/ noite estrelada, Van Gogh






terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

TransformAção








Em sua maioria os feriados permitem comemorações de toda ordem, sejam elas em família, em grupos ou mesmo só; com estes hiatos bem-vindos a gente se diverte, descansa, recarrega as energias ou se cansa mais um pouco, mas em nome de gostosas reuniões, tudo é válido.

A casa fica transbordante.Família e amigos enchem os espaços, o coração e os dias, que ficam pequenos diante de tantos envolvimentos.Quando um dos convivas que queira se isolar um pouco da agitação, vai atrás dum cantinho reservado e desfruta duns momentinhos de calma.Pois,foi o que fez a netinha de onze anos.Deixou a criançada na farra e se acomodou num cantinho junto com seu gibi do Chico Bento.O que ela não esperava é que fosse descoberta tão rapidamente.Dois pequenos a puxá-la de um lado, ela a resistir sair de outro e no embate de gerações aconteceu o previsto, a revista rasgou umas páginas.Muito sentida, choramingando foi reclamar o acontecido e os pais deram pouca importância, afinal era só uma revista que tinha outras histórias que ainda estavam completas.Não era motivo para amuos...para eles, porque para ela não parecia assim, porém não fez disso drama maior e se deixou levar pelas brincadeiras dos pequenos.

À tardinha, todo mundo cansado, de baterias baixas e olhares tediosos pra televisão, me permitiram propor uma distração mais tranquila.Peguei as páginas rasgadas da revistinha, papel pardo, lápis cera e cola.A presentei tudo na mesa e fui rasgando as figuras em detalhes diferentes ( as arte-educadoras conhecem isso bem) e colando-as no papel.Logo três mãozinhas iam aumentando as imagens, colorindo, rabiscando e dando origem a uma " obra de arte."O amuo virou interesse, o papel rasgado, partes dum todo, a colaboração, um painel bacaninha que a mocinha quis levar pra por em seu quarto ao que a mãe logo declarou: __ Colar na parede, nem pensar!



Colar papéis impressos, jornais ou objetos em uma tela e apresentar o trabalho como arte é uma invenção não muito antiga. Os primeiros a fazerem isso foram Pablo Picasso e Georges Braque por volta de 1912.Eles colavam diversos materiais em suas pinturas a óleo. Braque juntamente com Picasso, inventou o cubismo revolucionando a pintura.Outros artistas também exploraram a técnica da colagem, Matisse e Ernst ajudaram a tornar esta técnica  extremamente importante no movimento modernista.


" Amo a regra que corrige a emoção.Amo a emoção que corrige a regra!"
(Braque)




( G.Braque)




( Picasso)


Temos hoje vários expoentes desta técnica artística que transforma o comum no imprevisto.



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Fonte/imagens: conexão cultural.org





segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

Urbi et Orbi








Lá vemos novamente a criançada uniformizada em bando voltando às aulas.Mochilas novas, material estalando de novo, primeira página do caderno ainda branquinha esperando a titulação que ganhará, a qual disciplina pertencerá.Euforia dos maiores, choros dos pequeninos a girar o calendário letivo.Ao se ater em algumas recomendações ressoadas no pátio de entrada, ouve-se muito, por parte dos pais ou responsáveis pela turma grandinha, coisas do tipo: "__ agora vc está em tal ano, nada de brincadeiras fora de hora, preste atenção e acompanhe as aulas, viu!"; ao que a garotada acena afirmativamente com a cabeça como que para sacudir pra fora a ladainha indesejável.

Existem outras, mas uma das mais faladas, bradadas, lembradas palavras que ecoam quase ininterruptamente é atenção.Fique atento(a), tenha atenção, olhe bem, direcione teu foco... sim, todo o pacote é válido, busca promover o bom conhecimento e em alguns casos a segurança, o bem-estar, como foi destacado dias deste num programa matutino em algumas dicas dum especialista em segurança urbana sobre a importância da atenção que deve estar sempre presente a cada passo que dermos nas ruas, seja a pé ou dentro de veículos, o que  na segunda opção deixam de ser passos e passam a ser deslocamentos motorizados.

 Tenha a designação correta ou não, o fato gritante e ensurdecedor é que não devemos, em hipótese nenhuma, sob quaisquer circunstâncias, flanarmos distraidamente pelos logradouros da cidade nos perdendo em vistas apreciadas ou sentarmos em banquinhos convidativos em meio à vegetação urbana ou o que valha.

Cansativo, pra dizer o mínimo, sobre estes tempos instáveis sombreados dum obscurantismo inexplicável, acabrunhador, que nos tolhe, encolhe e cerceia nosso direito de ir, ver e vir, afh! Alerta máximo, sempre à postos na defensiva de nosso inegável direito à vida, o qual deveria estar devidamente protegido e garantido pela pólis civilizada, deveria...Mas, em plena controvérsia do direito estabelecido, seguimos nós, dignos cidadãos e cidadãs reféns da ausência do Estado na manutenção da ordem pública, sendo responsabilizados pelas tragédias impostas na atual dita urbanidade.

Por isto e mais até, cantarolo baixinho que:"É preciso estar atento e forte.Não temos tempo de temer a morte[...] Atenção, para o refrão..."

Carnaval batendo á porta, mil preparativos e tais.Vai cair na folia? Vai fugir da balbúrdia? Seja qual for tua escolha, lembre-se do refrão e... Atenção!




Um bom Carnaval pra vcs!



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Imagem: tumblr


quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

Entrelaçamentos










*" Um dia o rei ficou surdo.Não como uma porta, mas como uma janela de dois batentes.Ouvia tudo do lado esquerdo, do direito não ouvia nada[...]"


Foi-se o tempo que esta estranha enfermidade do rei acima citado era aceita como verdade absoluta, a dicotomia estabelecida como limite demarcado pelos lados orientados.O que acontece do lado de cá não tem nenhuma relação com o lado de lá; controvérsias conhecidas e comprovadas.São muitas as situações que provam a interligação ressonante, estabelecendo laços pra lá e pra cá, em pequenas ou grandes espirais, em ciclos curtos ou longos, em ramificações restritas ou extensas.
Vivemos em rede,mais que isso, somos a rede.Uma rede física, mental e holística que a todo momento nos retifica sua existência miraculosa em todos os seus meandros.

Ouvir a cor do mar, ver a melodia dos ventos, falar no silêncio dos brotos nascidos, tocar o canto de um pássaro, sentir o aroma das nuvens,provar o sabor do amanhecer...Desaprender a rigidez dá-nos vivências inesperadas que sempre foram possíveis e bem conhecidas das crianças e dos poetas; um mundo ao alcance de todos(as) nós. 



"[...]Porque se a gente fala a partir de ser criança, a gente faz comunhão: de um orvalho e sua aranha, de uma tarde e suas garças, de um pássaro e sua árvore. Então eu trago das minhas raízes crianceiras a visão comungante e oblíqua das coisas. Eu sei dizer sem pudor que o escuro me ilumina. É um paradoxo que ajuda a poesia e que eu falo sem pudor. Eu tenho que essa visão oblíqua vem de eu ter sido criança em algum lugar perdido onde havia transfusão da natureza e comunhão com ela. Era o menino e os bichinhos. Era o menino e o sol. O menino e o rio. Era o menino e as árvores."

(Manoel de Barros)




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* Excerto do conto de Marina Colassanti, Uma ideia toda azul.
* Excerto de crônica do livro: Memórias Inventadas, Manoel de Barros